PSYCHOPEDAGOGICAL EVALUATION OF LITERACY
Giovana Ilíada Giacomini1. Elizabeth Abelama Sena Somera2.
1- Mestre em Estudos Linguísticos (IBILCE/UNESP São José do Rio Preto); Professora do Ensino Fundamental, Médio e Superior; Especializanda em Psicopedagogia Clínica e Institucional: Educação e Saúde, Curso de Pós-Graduação Lato Sensu da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Turma 2010.
2- Doutora em Educação Escolar pela UNESP de Araraquara; Mestre em Ensino na Educação Brasileira pela UNESP de Marília; Professora de Didática de Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu da FAMERP; Coordenadora do Centro de Apoio Pedagógico-Educacional da FAMERP.
Resumo: Este trabalho tem como objetivo discutir o ensino da língua escrita, especialmente o conceito de letramento, que se refere ao uso dessa linguagem na sociedade em diversos contextos e com variados graus de exigência. Objetiva-se também mostrar que a Psicopedagogia, ciência cujo objetivo é diagnosticar e tratar dificuldades de aprendizagem de variadas naturezas, pode oferecer uma avaliação adequada do nível de letramento do aluno e, por meio do tratamento, seu desenvolvimento.
Palavras-chave: Língua escrita; Letramento; Avaliação Psicopedagógica.
Abstract: The purpose of this paper is discuss the teaching of written language, especially the concept of literacy whose concept is the use of this and whit language in society in different contexts and with several degrees of demand. It also aims to show that psychopedagogical science whose goal is to diagnose and treat learning difficulties of several kinds, can properly evaluate the level of student's literacy and, through treatment, his development.
Keywords: Written language; Literacy; Psychopedagogical evaluation.
Introdução
Este trabalho tem como objetivo avaliar questões concernentes à apropriação da escrita no ensino escolar, especialmente no que se refere ao fenômeno do letramento, ou seja, o processo de inserção do indivíduo numa cultura letrada.
Além disso, objetiva-se discutir as contribuições que a Psicopedagogia, ciência que tem como objetivo diagnosticar e tratar dificuldades de aprendizagens de diversas naturezas, pode oferecer a esses alunos que, no processo de escolarização, não desenvolveram graus avançados de letramento.
Desde os primeiros anos de vida, o ser humano está em contato com a linguagem verbal, especialmente a oral. Ao escutar os adultos usando-a para se comunicar, a criança se apropria dela e passa a utilizá-la gradualmente. De acordo com Marcuschi (2003, p. 18), essa apropriação da linguagem oral acontece pelo fato de ela ser elemento de inserção cultural e de socialização.
A aquisição da escrita dar-se-á mais tarde, no ensino escolarizado, formal. Quando o aluno chega até a escola, então, ele já conhece vários mecanismos inerentes à oralidade. Entretanto, pelo fato de viver em uma sociedade letrada, ele chegará à escola também com algum conhecimento da língua escrita, o que Marcuschi (2003, p. 19) define como a influência de práticas de letramento da sociedade em que vive, que acontecem nos diversos setores do cotidiano tais como trabalho, dia-a-dia, vida burocrática, entre outros. Assim, não há alguém totalmente iletrado, o que, para Tfouni (2002, p. 23), equivaleria ao “grau zero” ou iletramento total. Mesmo as pessoas consideradas analfabetas são influenciadas pela sociedade letrada na qual vivem.
Entende-se que docentes da disciplina de Língua Portuguesa tenham convicção da relevância do ensino das noções de letramento e multiletramento, que visam construir e transformar a realidade social; para tanto, sugere-se, segundo Santos (2006, p. 58-59), que recorram à produção da escrita e leitura de textos multimodais, isto é, textos que permitem a compreensão de múltiplas fontes de linguagem porque são constituídos com estruturas voltadas à construção do sentido e que incorporam inúmeros códigos semióticos verbais e não-verbais.
No entanto, diversas avaliações oficiais têm demonstrado que grande parte dos alunos termina o ensino básico com dificuldades na leitura e na escrita de textos dos mais variados tipos e graus de complexidade. Nesse contexto, o psicopedagogo, por meio da avaliação do aluno e dos fatores inerentes ao seu entorno social, o que inclui a escola e a família, oferecerá ferramentas de avaliação dos graus de letramento do aluno e alternativas de desenvolvimento dessa habilidade.
Ensino da língua escrita e o conceito de letramento
Enfatiza-se que toda pessoa que está inserida em uma sociedade letrada tem algum grau de letramento, pois a linguagem escrita faz parte de seu cotidiano. No entanto, ainda que a sociedade ofereça tais situações de contato com a escrita, a escola ocupa lugar privilegiado em sua aquisição, pois é por meio dela que os alunos conhecerão as convenções inerentes à linguagem escrita, ou seja, serão alfabetizados. Além disso, pela prática da leitura e da escrita, também saberão utilizar essas convenções no entendimento de diversos tipos de texto e também na sua produção. Ou seja, a escola oferecerá um repertório a mais de práticas de leitura e escrita além do que a sociedade oferece a eles.
De fato, na práxis didática do professor de Língua Portuguesa, a seleção de textos vai além dos que configuram o cotidiano do aluno, pois visam qualidade e multimodalidade, por meio de gêneros diferenciados, que consideram os ambientes em que os textos aparecem, os fatores como a intenção, a situação e os interlocutores, além de forma, conteúdo e estilo e os aspectos sócio-comunicativos e funcionais (MARCUSCHI, 2005, p. 21).
Para as crianças de classes sociais mais baixas, a importância da escola torna-se ainda maior, já que, de acordo com Kleiman (2003, p. 39), as práticas de letramento são diferentes a depender da cultura, do contexto social, econômico, político, educacional. Como as crianças de tais classes geralmente têm menos oportunidades de contato com a escrita em casa, pela baixa escolaridade de sua família, então é na escola que elas terão maior contato com livros, jornais, revistas, entre outros. Além disso, é por meio dela que tais alunos aprenderão a linguagem formal que, para Teixeira Ataliba (apud Ramal, 1999, p. 38), é a maneira de falar e escrever considerada padrão por ser praticada pela classe de prestígio. Pelo fato de grande parte das famílias de classes sociais desfavorecidas não conhecerem e não fazerem uso dessa linguagem, a escola é o único ou principal lugar em que ela é ensinada e praticada.
Portanto, o ensino da linguagem escrita na escola é imprescindível para que os alunos a dominem e possam utilizá-la no dia-a-dia. Sem esse domínio, de acordo com Ramal (1999, p. 35), é comum que as pessoas sejam marginalizadas socialmente, tornem-se limitadas no entendimento de textos escritos cotidianos, dependam de outras pessoas para diversas situações de prática de leitura e escrita e, portanto, estejam mais sujeitas a serem enganadas e menos valorizadas que outras pessoas. Isso traz, portanto, muitos problemas para a vida cotidiana.
Freire (1996, p. 77) defende que é papel do educador e da escola promover nos alunos a consciência de que eles não são objetos da história, mas sim sujeitos que podem fazer com que ela mude. Entretanto, como ser sujeito dessa mudança se, conforme foi afirmado anteriormente, eles são marginalizados e limitados socialmente? Assim, o conhecimento e o pleno domínio da linguagem escrita é um fator de ascensão social e condição fundamental para que se atue criticamente em sociedade. Portanto, a escola tem como função, além de alfabetizar, promover situações de prática da leitura e escrita, a reflexão sobre a função dos diversos gêneros textuais na sociedade e o domínio da norma padrão tanto oral como escrita. Assim, de acordo com Ramal (1999, p. 36), o aluno deveria sair da escola com autonomia para lidar socialmente com as representações linguísticas.
No entanto, estatísticas mostram que muitos alunos saem da escola sem saber o mínimo de tais habilidades. De acordo com o 9º Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional – INAF (IPM, 2009, p. 5-6), existem quatro níveis de alfabetização: o analfabetismo, em que não se consegue realizar tarefas simples que envolvam leitura e escrita; o alfabetismo nível rudimentar, em que se consegue localizar informações explícitas em textos curtos e familiares; alfabetismo nível básico, em que se consegue ler textos e localizar informações, mas há limitações no que se refere a atividades que envolvam mais etapas ou relações; alfabetismo pleno, em que se consegue ler e compreender textos de menor ou maior extensão e compreender suas partes e seu sentido global. Os dados do INAF de 2009 mostram que, embora o nível de analfabetos absolutos tenha diminuído nos últimos dez anos, somente 38% dos estudantes que cursaram alguma série ou terminaram o nível médio de ensino podem ser considerados plenamente alfabetizados, embora o esperado para tal nível seja de 100% (IPM, 2009, p. 11). Dessa forma, a aquisição de leitura e escrita tem sido muito abaixo do esperado.
Assim, é preciso que se reavalie o ensino de leitura e escrita na escola. Se ela é a instituição social responsável pelo ensino formalizado da linguagem escrita, deve repensar sua prática a fim de que os alunos saiam preparados para usar tal linguagem em sua vida. Para isso, não basta que eles saibam decodificar seus elementos. É preciso saber lidar com ela socialmente em situações como elaborar um currículo, buscar informações em textos de variados gêneros e extensões, entender o sentido global do que se lê, seguir instruções.
Tal como o INAF, Soares (2004, 14-15) acredita que haja diferença entre saber decodificar o sistema escrito e dominá-lo na prática. A autora propõe uma distinção entre alfabetização e letramento: para ela, ser letrado é mais do que ser alfabetizado, pois a alfabetização é quando o aluno adquire o sistema convencional da escrita, sabe decodificá-la e reproduzi-la. Já o letramento é o domínio do conjunto de habilidades de uso dessa linguagem em atividades de leitura e escrita nas diversas práticas sociais em que são exigidas.
De acordo com a tradição escolar dos últimos anos, apenas recentemente tem-se associado a alfabetização e o letramento. Para Soares (2004, p. 15), no ensino em que as cartilhas exerciam papel fundamental na alfabetização, o letramento era contemplado posteriormente à alfabetização. Assim, primeiramente eram oferecidas técnicas de decodificação e memorização do sistema escrito e, depois que esta etapa fosse terminada e dominada pelos alunos, eles travariam contato com práticas diversas de leitura e escrita.
Desta forma, a maneira como se ensina a alfabetização e o letramento depende do paradigma educacional de uma determinada época, escola ou de um docente. Para Monteiro (2010, p. 59), a concepção que o professor traz de alfabetização e prática de leitura é que o leva a organizar ou ministrar práticas que apenas preparem o aluno para ler e escrever ou que o prepare para responder às exigências sociais com relação à leitura e à escrita.
Soares (2004, p. 15), apesar de defender que ambos os processos são interdependentes, defende que, diante do cenário de fracasso escolar presente atualmente, faz-se necessário rever a maneira como se ensina a linguagem escrita nas escolas e reconhecer a possibilidade de fazer distinções entre ambos os processos.
Conciliação entre essas duas dimensões da aprendizagem da língua escrita, integrando alfabetização e letramento, sem perder, porém, a especificidade de cada um desses processos, o que implica reconhecer as muitas facetas de um e outro e, consequentemente, a diversidade de métodos e procedimentos para ensino de um e de outro, uma vez que, no quadro desta concepção, não há um método para a aprendizagem inicial da língua escrita, há múltiplos métodos (SOARES, 2004, p. 15).
Assim sendo, as atividades que envolvem o ensino da linguagem escrita devem contemplar a alfabetização e o letramento, mas devem ser consideradas as especificidades de cada uma delas. Para a autora, é preciso reconhecer que a alfabetização e o letramento são processos interligados, mas específicos e, portanto, seu ensino deve reconhecer isso.
Entretanto, isso não significa que o ensino da sistematização da linguagem escrita deva ser feito por meio de atividades descontextualizadas e baseadas em exercícios de simples memorização das famílias silábicas, mas sim que algumas atividades terão como objetivo preponderante a sistematização, outras a prática do letramento. Trata-se de delinear melhor os objetivos pedagógicos de cada prática docente.
Segundo Delphino (apud Dell´Isola, 2006, p. 1699), o ensino da linguagem escrita deve ser pensado por “projetos de multimodalidade” justamente pela possibilidade da seleção de textos que contêm recursos como: tipos de modos representacionais e comunicacionais, formatação, tipo de fonte, presença de imagens e todo tipo de informação advinda de quaisquer modos semióticos embutidos na cultura humana, componentes que também constituem meios de expressão do conteúdo do texto.
Assim, infere-se que é preciso levar em conta a multimodalidade como traço constitutivo do texto e que este trabalho precisa compor as práticas na linguagem dentro do espaço escolar para que a língua seja destacada em seu funcionamento no meio das práticas sociais, obtendo-se um letramento ou multiletramento funcional.
Monteiro (2010, p. 96-109) sistematizou algumas orientações para auxiliar os docentes no ensino de leitura e escrita. Todas as orientações baseiam-se na ideia de que o ensino deve ser baseado em atividades de uso prático da linguagem, ou seja, com atividades contextualizadas. Entretanto, elas poderão ser adaptadas e moldadas a depender do enfoque que o professor quer ou necessita dar aos alunos. Entre elas, destacam-se: atividades com nomes próprios e documentos pessoais, em que cada aluno deve pesquisar a origem do seu nome próprio, seus documentos pessoais e, por meio dessa descoberta, faz-se a sistematização dos resultados trazidos por todos os colegas de sala; localizar letras em jornais, revistas, propagandas, livros diversos e, por meio dessa atividade, pode-se atingir vários objetivos como a escolha de palavras com as iniciais do nome do aluno ou de outra letra a ser trabalhada; bingo de letras ou sílabas; pesquisar o nome de funcionários da escola, da família, suas funções e posterior estudo das palavras; trabalhar com contos de fada e as impressões de cada aluno, sendo a sistematização feita por meio dos nomes dos personagens, de palavras do enredo, entre outras. Todas essas atividades procuram ensinar a leitura e a escrita em atividades contextualizadas, portanto, reflexivas e interessantes para os alunos.
Psicopedagogia e letramento
Com a presente difusão dos achados na literatura, pôde-se observar que uma das razões do fracasso escolar dos alunos é a falta de domínio da linguagem escrita tanto no nível de alfabetização quanto no de letramento. Portanto, muitos deles procuram especialistas trazendo consigo tais dificuldades como causa ou consequência dos problemas de aprendizagem.
Entre os especialistas procurados, está o psicopedagogo. De acordo com Bossa (2000, p. 23), o surgimento da Psicopedagogia deveu-se à necessidade de se compreender melhor o processo de aprendizagem e se tornou uma área específica, cujo objetivo é buscar conhecimento em outros campos e delinear seu próprio objeto de estudo. Trata-se, assim, de uma área do conhecimento que busca avaliar os padrões de aprendizagem e de desenvolvimento humano, os fatores que a influenciam e as intervenções que podem ser feitas a partir do diagnóstico.
Dessa forma, esse profissional pode contribuir muito para diagnosticar e tratar as dificuldades de aprendizagem concernentes à apropriação da linguagem escrita. Para isso, ele precisa desenvolver ferramentas que avaliem não só a alfabetização, mas também o letramento e seus graus.
Isso porque, de acordo com Weiss (2008, p. 17), a Psicopedagogia considera que toda possibilidade de absorver conhecimento pelo aluno dependerá da maneira como esse conhecimento foi ensinado. Dessa forma, o psicopedagogo não deve investigar apenas o aluno, mas sim o contexto escolar e familiar. No que concerne ao letramento, se o professor não promove situações de desenvolvimento da prática social da escrita e da leitura e se no contexto familiar essa prática é reduzida, explica-se o porquê de o aluno muitas vezes ter problemas na escola, pois não consegue interpretar o que lhe é solicitado, não interpreta mapas e gráficos, dentre outros. Portanto, pelo fato de a Psicopedagogia considerar escola e família e sua influência na dificuldade do aluno, tais fatores aparecerão na avaliação diagnóstica e ele poderá intervir por meio de orientação à escola e à família.
No que se refere à escola, para Weiss (2008, p. 18), é comum que ela ignore o que a criança já traz de conhecimento antes do ensino escolarizado, portanto, ignora que ela já chegue parcialmente letrada. Esse fator também será considerado pelo psicopedagogo, que partirá em suas atividades do que o aluno traz de conhecimento, suas preferências e aptidões. Isso reduzirá a ansiedade do paciente que, de acordo com Weiss (2008, p. 22), aparece especialmente naquele que traz dificuldades de aprendizagem: é comum que ele tema o novo, sinta-se incapaz, já que é muito cobrado pela família e pela escola. Dessa forma, o psicopedagogo desenvolverá mecanismos de redução dessa ansiedade.
O psicopedagogo também é capaz de utilizar recursos metodológicos que permitem depreender as capacidades e as dificuldades dos alunos quando da produção de textos; compreende, avalia, apoia e cria situações de aprendizagem partindo de suas capacidades e de seus erros para organizar o ensino, salientando os principais obstáculos a serem ultrapassados em função dos diferentes componentes dos textos trabalhados: esta é a postura para saber adaptar, da melhor forma possível, o ensino aos aprendizes da escrita.
No caso do letramento, as atividades que o psicopedagogo desenvolverá deverão contemplar atitudes cotidianas do universo do paciente tais como o uso da linguagem escrita em uma lanchonete ao escolher seu lanche, a elaboração de um diário, um cartaz, um bilhete para alguém da família, uma lista de supermercado, entre outras. Isso deve ser feito desde a avaliação diagnóstica, por meio da elaboração de um protocolo que contemple atividades que exigem níveis variados de letramento.
Além disso, também no tratamento, as atividades cotidianas são importantes de forma a motivar o aluno a usar a linguagem em situações rotineiras. A partir de tais atividades, depois que o aluno tiver melhorado seu nível de letramento e de ansiedade, o profissional poderá ampliar o seu conhecimento por meio do uso de outros textos, da execução de tarefas um pouco mais complexas tais como relacionar um mapa com outro texto, buscar informações específicas e interpretá-las nos mais diversos tipos de texto. Assim, o educando estará preparado para lidar com os diversos desafios sociais que envolvam a linguagem escrita.
Dessa forma, a Psicopedagogia fornecerá elementos para que o aluno desenvolva seu grau de letramento e atenda às expectativas da sociedade, de que as pessoas devem ser leitoras e escritoras competentes. Para isso, é preciso que o psicopedagogo tenha, além de conhecimento teórico e comprometimento com a melhora do paciente, o que Weiss (2008, p. 32) define como “sensibilidade do terapeuta”. Para ela, o diagnóstico é bem-sucedido não quando conta com vários instrumentos de avaliação, mas sim com essa sensibilidade, que permite a exploração de múltiplos aspectos revelados em cada situação. Aliando seu conhecimento com essa sensibilidade, o psicopedagogo deverá avaliar tanto a alfabetização como o letramento e, no tratamento, promover, muitas vezes, o que a escola não faz ou não tem como prioridade: situações de uso prático e social da leitura e da escrita, isto é, situações de desenvolvimento do letramento e, consequentemente, oportunidades de atuar em sociedade como cidadão.
Conclusão
Como pôde ser observado, o domínio da linguagem escrita é extremamente importante para qualquer pessoa, pois aquela que não o possui muitas vezes é limitada em seu dia-a-dia, no mercado de trabalho, no acesso às informações. Dessa forma, a escola, como lugar privilegiado de ensino formal da língua materna, tem como função promover nos indivíduos esse domínio e, por meio dele, oportunidades de ascensão social e exercício da cidadania. Entretanto, muitas pessoas saem da escola sem dominar a habilidade leitora e escritora e, durante o processo escolar, encontra muitas dificuldades para acompanhar o ensino dado e adquirir conhecimentos de diversas disciplinas.
Nesse contexto, a Psicopedagogia poderá oferecer elementos de diagnóstico e tratamento de tais dificuldades. Isso porque essa ciência tem como característica avaliar o processo de aprendizagem e os elementos que condicionam as dificuldades. Com o conhecimento teórico advindo de várias outras áreas do conhecimento, inclusive a Linguística, e dotado de uma sensibilidade de olhar para as dificuldades de maneira global, esse profissional tem condições de avaliar o grau de letramento do aluno e promover seu desenvolvimento por meio de diversas atividades.
Para que se chegue ao resultado esperado, ou seja, ao desenvolvimento de um nível avançado de letramento no paciente, o psicopedagogo deverá efetuar um estudo longitudinal de seu aluno a partir da primeira consulta e em cada sessão psicopedagógica de modo a avaliar seu grau de letramento após cada orientação ou intervenção desenvolvida com atividades de uso da linguagem escrita em diferentes níveis. Poderá, inclusive, lançar mão de protocolos validados para avaliação da compreensão leitora de textos expositivos. Esse protocolo deverá ser aplicado a pacientes que já são alfabetizados, mas não têm o domínio da linguagem escrita e contemplará atividades de uso da linguagem escrita de diferentes níveis para que seja avaliado o grau de letramento em que o indivíduo se encontra.
Exemplificando, especificamente, o primeiro recurso citado é referente à leitura e análise de textos agrupados em gêneros, estilos ou formas de representação multimodal, partindo-se do pressuposto que cada um deles sinaliza sua espécie e favorecem a construção do sentido do material para posterior reconhecimento de quais situações de produção e uso (ações) que foram desenvolvidas, de tal forma a servirem de exemplos para novas produções. A base desta ideia está no fato de que é possível criar textos a partir de textos anteriores, que estão disponíveis nos cenários vivenciados pelo aluno, bem como de compreender textos de outros produtores que também compõem tais cenários. Com este material, a avaliação será fruto de observações das produções e de atribuição de pontuação de zero a dez.
Um segundo recurso, pode ser a aplicação de um protocolo para avaliação da compreensão leitora de textos expositivos, como o elaborado por Saraiva et al. (2006). Trata-se de um material composto por um jogo com 18 cartões e cinco protocolos para avaliação cujo objetivo principal é auxiliar os psicopedagogos e fonoaudiólogos na avaliação da compreensão leitora dos pacientes a eles encaminhados, a partir da faixa etária correspondente ao 1º ano do Ensino Fundamental até a idade adulta.
Esta avaliação leva em consideração a importância do uso de textos expositivos na escola, que estão presentes em todas as áreas de conhecimento, cuja compreensão será a causa do sucesso ou fracasso do aluno nas diferentes disciplinas. Os textos possuem organizações diferenciadas (superestrutura), com pistas textuais e informações capazes de interferirem na compreensão leitora. Precisamente, foca como devem ser observados e analisados os aspectos cognitivos, metacognitivos e motivacionais do aluno durante o ato da leitura.
A partir daí, com base nos registros feitos, o psicopedagogo estabelecerá estratégias de ampliação desse nível do grau de letramento de forma a prepará-lo para a vida cotidiana.
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Correspondência:
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