O importante da educação não é apenas formar um mercado de trabalho, mas formar uma nação, com gente capaz de pensar. (José Arthur Giannotti)




domingo, 21 de novembro de 2010

O espaço da literatura infantil: uma literatura dentro da outra?




Prof.ª Dr.ª Maria do Carmo Monteiro Kobayashi[1]
Prof.ª. Ms. Cinthia Maria Ramazzini Remaeh[2]

Resumo:

Neste artigo apresentamos as possibilidades e a relevância da literatura infantil na formação do leitor-criança. Nossa proposta é mostrar a literatura infantil como suporte para que o ouvinte-criança goste de ler, compreenda melhor a realidade, fortaleça seus sentimentos, minimize seus medos e, sobretudo organize seu pensamento. Para tanto, iniciaremos com o espaço ocupado pela literatura infantil na da Literatura. Em seguida, apresentaremos as competências necessárias para a leitura. Discutiremos o papel da literatura infantil em nossas vidas e, finalmente, as características do leitor-criança como forma de sinalizar possibilidades de uso dessa literatura em sala de aula.

Palavras-chave: Leitor-criança. Literatura Infantil. Competências para leitura. Sala de Aula.


Abstract

We present in this communication the possibilities and the importance of child´s literature in the formation of the young reader. Child`s literature enchants in special way the child and the educator, since the decade of 80, but the difficulties to work with similar thematic are found in the unfamiliarity of relative questions to the listener, as well as the essential aspects for a pleasant reading. Thus, our proposal is to show the child´s literature as a resource so that the listener likes to read, understands the reality better, fortifies its feelings (RABBIT, 2004), minimizes its fears (BETTELHEIM, 2004) and over all organizes its thoughts (PIAGET, 1994). We will initiate inside with the space for the infantile literature inside the Literature. After that, we will discuss the paper of infantile literature in our lives and, finally, the characteristics of the young reader as form to point out the possibilities of use of this literature in classroom.


Key-words: Fiction. Young reader. Child´s Literature. Classroom.


Primeiro encontro com a literatura: o espaço da literatura infantil num universo maior

A literatura infantil vem encantando de modo especial a criança e o educador, desde a década de 80, do século passado, mas as dificuldades de bem trabalhar semelhante temática esbarram no desconhecimento de questões relativas ao próprio ouvinte, bem como aos aspectos essenciais para uma leitura prazerosa, quais seriam então as dificuldades em trazê-la para a sala de aula?
            Uma das questões, constantemente, presentes quando se fala em literatura infantil, é o espaço que ela ocupa no conjunto maior de obras chamado Literatura. Seria possível situá-la no quadro de gêneros literários? Seria ela um subgênero?
            Apesar das controvérsias ligadas à conceituação de gênero literário em geral, lançaremos mão dele, seguindo o proposto por Coelho (2000), a fim de encontrarmos o referido espaço.
            Para Coelho,
          Gênero (ou forma geradora) é a expressão estética de determinada experiência humana de caráter universal.
            Assim, quando o eu está mergulhado em suas próprias emoções, temos a chamada vivência lírica, que se expressa através da poesia; se há uma relação do eu com o outro, com o mundo social, temos a vivência épica e a expressão se dá via prosa, ficção; quando o eu se entrega ao espetáculo da vida, temos a vivência dramática e o teatro como forma de expressão.
            A ficção, por sua vez, abrange toda e qualquer prosa narrativa literária (COELHO, 2000, p. 163), possuindo as chamadas formas básicas que irão se diversificar em diferentes categorias, dependendo do tema, da intencionalidade... E a essas formas básicas pertence a literatura infantil, que é dirigida a um leitor especial, posto que está vivenciando a aprendizagem inicial da vida. Dessa forma, ela deverá excitar seu interesse, quer seja através das aventuras ou da pintura de paixões e costumes. É preciso diverti-lo, emocioná-lo, provocar seu interesse, a fim de transmitir-lhe uma experiência duradoura ou fecunda. Isso porque, quer queira ou não, a literatura infantil possui um caráter conscientizador e lúdico.
            Interessante ainda ressaltar que as narrativas conhecidas como de tradição popular ou folclórica, resultantes de uma criação espontânea, dado o seu caráter simples e autêntico, acabaram sendo assimiladas pela literatura infantil. São as fábulas, apólogos, parábolas, lendas, mitos entre outras.
            Uma vez esclarecido o espaço ocupado pela literatura infantil no universo da Literatura maior e apresentadas as primeiras reflexões sobre seu papel em nossas vidas, passemos a analisá-lo com maiores detalhes.

A Literatura infantil na vida da criança: como se dá esse encontro?

            Contar histórias... Quem nunca contou uma história? Por outro lado, quem nunca ouviu uma história? As histórias do dia-a-dia, as histórias dos bichos, as histórias dos países, as histórias das descobertas... São tantas histórias! Existem, porém, aquelas que estão sendo repetidas há muito tempo e que continuam a ter um papel fundamental na vida das crianças e dos adultos. Nossas pesquisas (KOBAYASHI, 2005a, 2005b) apontam para um fato curioso: os professores que entrevistamos na faixa entre 30/35 a 50/55 anos ouviram histórias (fábulas, contos de fadas, contos de encantamentos entre outros) transmitidas pelos seus parentes. E aqui aparecem os pais, avós e tios, nessa ordem de freqüência. Os mais jovens (entre 20 e 30 anos), por sua vez, contam que foi na escola que eles ouviram histórias.
            Esses dados nos remetem ao fato de que a escola está assumindo um papel que era da família e da comunidade. As pessoas se sentavam na frente de suas casas e lá é que ocorriam os serões de histórias e de casos. Nas famílias, o aconchego da cama ou mesmo do berço era o espaço usado pelos pais e avós para estarem próximos aos pequenos. Hoje, há um movimento de conscientização dos pais e familiares sobre a importância desses momentos na vida da criança. A correria do dia, o agito da sociedade tecnológica não permitem que as famílias se encontrem e que esse velho costume se perpetue. Diante disso, fica a pergunta: em tempos de tecnologia, ainda há espaço para as histórias infantis?
            Segundo Abramovich (2002, p. 17):

Ler histórias para crianças, sempre, sempre ... É poder sorrir, rir, gargalhar com as situações vividas pelas personagens, [...] poder ser um pouco cúmplice desse momento de humor, de brincadeira, de divertimento... É também suscitar o imaginário, é ter curiosidade respondida em relação a tantas perguntas, é encontrar outras idéias para solucionar questões (como as personagens fizeram...) É uma possibilidade de descobrir o mundo imenso de conflitos, de impasses, das soluções que todos vivemos e atravessamos – dum jeito ou de outro – através dos problemas que vão sendo defrontados, enfrentados (ou não), resolvidos (ou não) pelas personagens de cada história (cada uma a seu modo). É a cada vez ir se identificando com outra personagem (cada qual no seu momento que corresponde àquele que está sendo vivido pela criança).

            A literatura infantil hoje deve ser vista como um meio das crianças comungarem com o mundo, de saber que somos seres de um mesmo planeta, que temos os mesmos medos, as mesmas origens, que a experiência humana pode ser advinda do que lemos e que na leitura podemos adentrar para um mundo que a experiência muitas vezes não nos é possível. Nascida dos contos folclóricos e dos clássicos, como nos mostrar Tatar (2004) não podemos deixar de mostrar as aproximações entre a morte de Golias por Davi, na Bíblia, e o Pequeno Polegar; de Cordélia de Shakespeare, Jane Eyre de Charlotte Brontë e Cinderela  de Perrault. Assim como não poderíamos deixar de lado as fábulas de Esopo e de Fedro, que de cunho moralista, unem pedagogia e lições para a vida em sociedade. Mas vamos nos centrar na literatura infantil brasileira, pois ela vai nos mostrar um período de muita criação, com avanços e retrocessos. 
            O desenvolvimento da literatura infantil no Brasil, segundo Cunha (2001), pode ser brevemente sintetizado em quatro períodos: a primeira que vai do final do século XIX aos anos 20. Esse período está ligado às manifestações iniciais da nossa literatura, sendo uma réplica dos padrões europeus e principalmente portugueses, fato facilmente compreensível com a vinda da família real portuguesa para o Brasil com toda a corte que influenciou de modo marcante nossa história.
O segundo período tem a forte influência das obras de Monteiro Lobato, que tem início em 1921, com a Menina do nariz arrebitado, prolongando-se até meados da década de 40. Falar de Lobato mereceria por si só um trabalho, dado o grau de importância da sua obra.
O terceiro período tem início no final da década de 40 e vai até a 1970, aproximadamente. A obra de Lobato deixa uma marca indelével na literatura nacional, compondo um tal cenário, que é impossível não sentir sua força. Segundo Coelho (2001), porém, nesse período houve também um momento no qual buscou-se banir o fantástico, o imaginário da literatura infantil. Foi a “caça às bruxas”, momento no qual se defendeu que o maravilhoso e o fantástico falsificavam a realidade e seriam perigosos para as crianças, pois poderiam levar a falsas verdades e a alucinações, tais como: distanciamento da realidade, perda de sentido do concreto, imaginação doentia... Essa visão resultou em uma produção “[...] estritamente real, mas no geral de medíocres ou nulos como literatura” (COELHO, 2001, p. 247). Para nossa felicidade, alguns autores mantiveram-se longe dessa visão e mantiveram-se fiéis ao fantástico. 
O último período iniciado na década de 70, marca a volta dos clássicos, sua reescrita com adaptações bem cuidadas, do aparecimento de obras que se dividem entre a realidade social e o cotidiano infantil, a criação de personagens com profundidade psicológica, e da apropriação dos elementos da cultura de massa que se dividem em histórias policias e de ficção científica, que sofrem as influências dos avanços científicos e da tecnologia, e na forma de apresentação com uma linguagem apelativa, com recursos visuais e elementos chamativos. Entretanto, a necessidade de consumo para a alimentar a produção de produtos em série expõe o leitor-criança a um sério risco, pois ele precisa se defender da torrente dos livros meramente comerciais que distorcem as histórias e, muitas vezes, apresentam conceitos equivocados, como por exemplo, “as mais belas fábulas” , quando o que se vê não passa de meras histórias sem as características citadas.
Como afirma Cunha (2001, p. 34), o percurso da literatura no Brasil é “[...] a tentativa entre dois pólos: pedagogismo e proposta emancipatória, massificação e liberdade expressiva. Hoje, quantidade e qualidade coexistem na literatura infantil, na qual a grande produção de textos estereotipados compete com o sucesso no mercado de bens culturais.” Mas falar de literatura infantil só tem razão quando se mira o seu público: a criança. E quem é o leitor-criança?

O leitor-criança e suas características

Mostra-nos a antropologia que o homem, dos seres viventes, é o único que não traz pronto seus padrões de comportamento já ao nascer. É no decorrer da vida que ele se construirá em função das experiências que lhes são oferecidas, e que ele as transformará em função de inúmeros fatores, inclusive os hereditários. Assim, ao se oferecer experiências de interpretação do mundo, como por exemplo, no sentido lato – a educação, irá se permitir mudanças de comportamento por meio de ações intencionais, pois o que nos diferencia dos animais é justamente o salto criativo decorrente da nossa capacidade de usar substitutos para representar algo, como os símbolos e signos. Assim, a escrita possibilitou ao homem guardar suas experiências, expressar seus sentimentos, avançar ao escrever sobre o que ainda não aconteceu.
A literatura, nesse sentido, permite-nos viver algo que não é nosso, mas que podemos por intermédio dela conhecer. Para o adulto, o ato de ler o remete a várias situações, tais como conhecer novos dados, informar-se, conhecer outros mundos, inteirar-se de novas descobertas, enfim, uma multiplicidade de situações.
Ao leitor-criança, a literatura ganha novo realce, pois: 

Se o homem se constitui à proporção da formação de conceitos, a infância se caracteriza por ser o momento basilar e primordial dessa constituição e a literatura infantil um instrumento relevante dele. Desse modo, a literatura infantil se configura não só como instrumento de formação conceitual, mas também de emancipação da manipulação da sociedade (CADEMATORI, 1995, p. 23).



Os estudos sobre a criança e a infância têm em Ariès (1981, p.) um referencial, que apesar das críticas, não pode ser ignorado. A sua obra realiza um estudo sobre a evolução do sentimento de infância que vai da sociedade tradicional à sociedade industrial para mostrar como esse sentimento foi alterado nesse período. Do anonimato à conquista de um lugar de destaque na sociedade, do sentimento de “paparicação”, como o autor denomina, ao centro da preocupação da família, da sociedade e da mídia:

[...] reservado à criancinha em seus primeiros anos de vida, enquanto ela ainda era uma coisinha engraçadinha. As pessoas se divertiam com a criança pequena como um animalzinho, um macaquinho impudico. Se ela morresse, então, como muitas vezes acontecia, alguns podiam ficar desolados, mas a regra geral era não fazer muito caso, pois outra criança logo a substituía. A criança não chegava a sair de uma espécie de anonimato.


Ainda Áries (19821) nos mostra que a partir do século XVII, ocorre uma alteração considerável em função de duas abordagens distintas. Na primeira, a aprendizagem deixa de ocorrer no seio da família e da sociedade e a criança deixa o mundo adulto para permanecer “resguardada” na escola, que “substitui a aprendizagem como meio de educação”. Mas essa mudança não seria possível sem o aval e a cumplicidade sentimental da família, sendo esta a segunda abordagem. A família passa a ser um lugar de afeição entre os cônjuges e entre os pais e filhos. Assim, a escola passa a ter um papel decisivo na sociedade, como nos dias atuais, quando nossos horários são em função da escolarização dos nossos filhos. A literatura nasce, assim, junto com a visão da infância. As obras de Perrault (1628-1703), La Fontaine (1621-1692), Andersen (1805-1875) e os Irmãos Grimm: Jacob e Wilhelm (entre 1785 e 1863) mostra essa adaptação das narrativas orais a nova visão de criança, e para tanto é escrita de forma a ser lida a esse público, mas as transformações não param. 

A rotina familiar gira, normalmente, em função da escola. E a educação escolar passa a ser uma área de pesquisas que arrebanha profissionais das mais diversas especialidades, tanto que “contar histórias” passa por uma sabatina, e os estudiosos da pedagogia, psicologia, sociologia entre outras áreas de estudos têm na literatura um farto campo de pesquisa, passando esta a ser não mais algo assistemático, mas um recurso de aprendizagem e de cura como nos mostra Bettelheim (1998).  
Os trabalhos de Piaget nos mostram as características do leitor-criança e para a criança pequena não há distinção entre o brinquedo e o livro. Ambos são objetos que podem se transformar em prazer. Brinquedos são oferecidos com muita freqüência para as crianças, já os livros, não basta que sejam oferecidos. É preciso muito mais. É preciso que os filhos vejam seus pais lendo. Vamos aos supermercados com as nossas crianças, compramos nossos alimentos, roupas, sapatos... E os livros? Eles nos vêem escolhendo livros?
Para as crianças entre 1 e 2 anos, o que chama atenção é o tom da voz, a cadência da história, o brincar com os sons, o movimento de fantoches, as onomatopéias, pois os objetos são mágicos e ganham vida própria. Daí a importância das histórias inventadas na hora, curtas e rápidas. Os livros de pano e de plástico, que resistem às mãos que estão descobrindo o mundo, e que devem ter figuras que mostrem coisas simples e atrativas visualmente, trarão ganhos em termos de linguagem, que nessa fase encontram-se em franco desenvolvimento e que: “[...] deve ser correta, de bom gosto, simples sem ser rebuscada. Os recursos onomatopaicos e as repetições contribuem para tornar a história mais interessante e dão força às expressões” (COELHO, 2002, p. 14).
A partir dos 2 anos, as histórias devem ser ainda rápidas, com um enredo simples e vivo, com um número de personagens que as crianças possam conhecer e controlar, e que se aproximem de suas vivências. O ritmo e a entonação da voz são recursos preciosos, bem como as histórias de bichinhos, de brinquedos, objetos e das próprias crianças.
A partir dos quatro anos e até por volta dos 6 anos, aproximadamente, a criança atinge a fase mágica e sua imaginação tem um poder fantástico de criação (Coelho, 2002), o que pode ser constatado com o “faz-de-conta” nas brincadeiras, esta fase é marcada pelo predomínio do pensamento mágico, o aumento significativo e rápido do seu vocabulário, quando a criança faz muitas perguntas, quer saber "como" e "por quê ?".
Para Piaget e Inhelder (1994) esse período caracterizado pelo egocentrismo, marcado pela dificuldade em se colocar na perspectiva do outro, e quando não há diferenciação entre a realidade externa e os produtos da fantasia infantil, os objetos ganham vida (animismo), o tempo e o espaço ainda são relativos às suas ações, não há passado nem futuro, a vida é o momento presente. Nessa fase, os textos devem ainda ter muitas imagens, pois o elemento maravilhoso começa a despertar interesse na criança. As histórias de repetição como “A formiguinha e a neve”, “Dona Baratinha” e os clássicos da literatura infantil, como “Os três porquinhos”. As crianças entre os 3 e 4 anos gostam de "O Lobo e os Sete Cabritinhos", "Cachinhos de Ouro", "A Galinha Ruiva" e "O Patinho Feio", que apresentam uma estrutura bastante simples e têm poucos personagens, sendo adequados às crianças desta faixa etária. Para os maiores (4 e 6 anos): "Chapeuzinho Vermelho", "O Soldadinho de Chumbo" (conto de Andersen), "Pedro e o Lobo", "João e Maria", "Mindinha" e o "Pequeno Polegar”.
A entrada no Ensino Fundamental, que a partir da Lei 11.274, de fevereiro de 2006, retira das crianças um ano de brincar, jogar, correr e de ser criança, fato que acreditamos seja muito grave, pois a corrida pela alfabetização precoce, em virtude do desconhecimento dos pais e da sociedade, pois muitas pessoas acreditam, que as crianças vão ganhar um ano na vida escolar, mas não consideram que, ao contrário, vão perder um ano de ser criança, e de criança que tem o direito de brincar, jogar e ouvir histórias, pois são elas que irão dar o palco para que as crianças sejam, simplesmente, elas.
Das etapas da vida por que passamos, nos humanos, do nascimento à senilidade, a infância é a mais curta, é o período que vai do nascimento até por volta dos 12 anos, mas são os anos de educação infantil e início do ensino fundamental, que tem se transformando muito. Apesar da produção cultural para a criança ter alcançado cifra inimagináveis, os produtos, em grande parte, não consideram as características da criança, mas lógica de mercado e o lucro fácil, uma lógica perversa, na qual o apelo ao consumo toca a parte mais sensível do consumidor – as crianças! 
A produção cultural infantil, hoje, como aponta Brougère (2003), associou os clássicos da literatura infantil ao cinema e aos produtos a serem vendidos a partir dos filmes e vídeos, prova disso é a produção da Disney na qual antes do produto cinematográfico está a preocupação com o brinquedo dos personagens e os assessórios decorrentes deles. Segundo esse pesquisador francês, desde a concepção do clássico a ser transformado em filme e desenho há uma preocupação com o “vir a ser” brinquedo dos personagens e dos produtos decorrentes desses personagens. Assim, na Pequena Sereia, um clássico de Andersen, jogos, roupas e uma sorte de produtos, infestam o mercado, ficando a história em segundo plano.
Como já apontamos anteriormente, nossa pesquisa mostrou que a mídia vem assumindo cada vez mais o lugar dos adultos na contação das histórias, esse momento de aproximação, de intimidade das crianças com os adultos está cada vez mais restrito, competindo ás telas da TV, do cinema e do computador contar as histórias, e aos pais e parentes a compra dos produtos destinados à criança. Por outro lado, a escola, pode ser uma instituição de resistência e ser um espaço no qual contar histórias de múltiplas formas, de memória, a partir de livros tenha um espaço garantido. 
O último ano da educação infantil e o primeiro ano do ensino fundamental marcam a separação da “escola de brincar” da “escola de verdade”. Para nossa tristeza, muitas vezes, há um rompimento do mundo mágico com o mundo da formação escolar, que hoje tem ocorrido cada vez mais cedo, pois é nesse período que as crianças têm interesse por ler e escrever. Com a diminuição do egocentrismo, a criança pode incluir outras visões que não somente as suas. O seu pensamento está mais estável e ela consegue estruturar melhor a sucessão dos fatos, desde que possa raciocinar sobre o concreto. Já consegue agir cooperativamente, os textos mais longos, mas ainda com imagens e o elemento maravilhoso exercem grande fascínio sobre a criança. Para nosso espanto é “[...] nesse momento que a maioria dos professores deixa de contar histórias (se é que contavam antes). Eles justificam a atitude, alegando que meninos da terceira série em diante não se interessam mais pelas histórias” (COELHO, 2002, p.19).
Sabemos que muito mais há para falar neste setor, mas esperamos ter contribuído com esta breve reflexão, para que a literatura infantil ocupe seu verdadeiro espaço na vida dos jovens leitores, para os quais se destina.


Referências

AGUIAR, V. T. Era uma vez... na escola. Formando educadores para forma leitores. Belo Horizonte: Formato, 2001.

ABRAMOVICH, F. Literatura infantil. Gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione, 2003.

BETTHELHEIM, B. A psicanálise dos contos de fadas. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

BROUGÈRE, G. Brinquedo e companhia. São Paulo: Cortez, 2003.

CADEMARTORI, L. O que é literatura infantil. São Paulo: Brasiliense, 1995.

COELHO, B. Contar histórias - uma arte sem idade. São Paulo: Ática, 2002.

COELHO, N, N. Literatura e linguagem. A obra literária e a expressão lingüística. Rio de Janeiro: José Olympio, 1974.

______ Literatura infantil. Teoria, análise e didática. SP: Moderna, 2000.

KOBAYASHI, M. C. M. Contar histórias e a formação de leitores infantis. In: Congresso Internacional educação e Trabalho. Representações Sociais, Competências e Trajetórias Profissionais. 2005. Aveiro. Anais do Congresso Internacional educação e Trabalho. Representações Sociais, Competências e Trajetórias Profissionais. Aveiro, 2005a. p. 223-224.

______  Contar histórias na educação infantil: uma aproximação entre gerações. In: VIII Congresso Estadual sobre Formação de Educadores. Modos de ser Educador. 2005, Águas de Lindóia. Anais do VIII Congresso Estadual sobre Formação de Educadores. Modos
de ser Educador. Águas de Lindóia: UNESP, 2005b, p.154.


PIAGET, J. INHELDER, B. A psicologia da criança. São Paulo: Bertrand Brasil, 1994.

TATAR, M. Contos de fadas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004.




[1] Professora Doutora em Educação – Universidade Estadual Paulista – UNESP – Faculdade de Ciências – Departamento de Educação
[2] Professora Mestra Universidade do Sagrado Coração – Bauru, Centro de Ciências HumanasBauru 

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